Leonel Henckes

Cartinhas à Professora

Na tarde do dia 29 de novembro de 2011 fui arrebatado por uma lembrança da primeira série do ensino fundamental. Foi durante o trabalho que minha colega, a escritora Laura Castro, apresentou para a disciplina de Processos de Encenação do curso de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da UFBA.

Estávamos no pátio da escola de Belas Artes da UFBA onde ocorreu a dinâmica. Bastões de giz estavam a nossa disposição e um imenso caderno deitado sob nossos pés. Alguns falavam, outros liam coisas, outros desenhavam, outros fotografavam e alguns escreviam.

Recebi meu bastão de giz das mãos do colega Ricardo. Estavam em um frasco de balinhas. Foi uma surpresa abrir esperando os doces e encontrar aqueles bastões.

Escolhi um local naquele caderno e comecei a desenhar minhas pegadas. Criava direções, contorcia meu corpo, me agachava, vez por outra não resistia a tentação de marcar minhas mãos naquele chão também. Traçado um “caminho para lugar nenhum”, decidi escrever dentro das pegadas. Escrevia frases soltas, palavras aleatoriamente ouvidas no espaço, sensações etc. Aos poucos percebi que sentidos foram se formando, que havia uma forma inscrita tridimensionalmente no espaço, uma escrita tridimensional. Me vi performando.

Subitamente lembrei lá da primeira série quando a professora Ieda nos ensinou a escrever e sugeriu que trouxéssemos cartinhas para ela como um exercício de escrita. Lembro que na época me encantei com o exercício e passei a escrever muitas cartas. As cartas evoluíam do plano bidimensional para estruturas tridimensionais com colagens, dobraduras, formas. Os bilhetes tornaram-se caixinhas, flores, tinham cores etc. Um verdadeiro exercício estético e criativo.

Lembro, também, que exagerei na quantia de cartas escritas, eram várias por dia e eu ansiava por terminar a aula de manhã para poder chegar em minha casa e escrever cartinhas para entregar no dia seguinte. A professora precisou pedir para parar, e com razão, havia passado dos limites, mas, era divertido afinal.

Esta lembrança apareceu com força enquanto escrevia/performava no chão do pátio de Belas Artes. Entendi que estava em ação, no aqui e agora articulando conteúdos diversos em formas materializadas naquele chão. O processo performático ocorria na medida em que eu marcava a mim mesmo naquele caderno de concreto. Absorto na experiência sentia um enorme prazer, como na infância sentia ao escrever cartinhas à professora.

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